O biênio 2024/2025 confere destaque extraordinário ao Brasil no cenário internacional. Nestes dois anos, a maior economia da América Latina, de acordo com o relatório “World Economic Outlook” – projetado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) – sediou a Cúpula de Líderes do G20 e se organiza para receber as delegações estrangeiras para o encontro anual do BRICS e a COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas). Desta forma, o maior país do Hemisfério Sul transforma-se na central da diplomacia global, a fim de coordenar o futuro do planeta nas áreas sanitária, econômica, social, política, ambiental e geopolítica. Na prática, ao conduzir as agendas destes fóruns, o Brasil intenciona sustentar sua liderança na região latina e cooperar no desenvolvimento do Sul Global.
G20
Sob o tema “Construindo um Mundo Justo e um Planeta Sustentável”, o Brasil presidiu, em novembro de 2024, a 18ª Cúpula de Líderes das maiores economias do mundo, no Rio de Janeiro. Na direção do bloco, o Brasil lançou a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, instaurou o G20 Social e priorizou o debate sobre o desenvolvimento sustentável, transição energética e reforma da governança global. As ponderações sobre tais temas resultaram na “Declaração do Rio de Janeiro”.
O G20 Social fortaleceu o vínculo entre a sociedade civil e o G20, ao assegurar a participação das entidades nos grupos C20 (sociedade civil), T20 (think tanks), Y20 (juventude), W20 (mulheres), L20 (trabalho), U20 (cidades), B20 (business), S20 (ciências), Startup20 (startups), P20 (parlamentos); SAI20 (tribunais de contas), J20 (cortes supremas) e O20 (oceanos).
Concernente a governança global, houve o encontro entre os Ministros das Relações Exteriores nas Nações Unidas, em Nova York, com a participação de todos os estados-membros, o que é novidade. Nos bastidores, o objetivo consistiu na aproximação do G20 com outros Estados em prol da reforma das instituições internacionais.
Contudo, a liderança brasileira no G20 sagrou-se com a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, cuja meta é erradicar a fome no mundo até 2030. A iniciativa angariou apoio de 82 países, a União Africana, a União Europeia, instituições financeiras e organizações internacionais e entidades filantrópicas e não-governamentais.
Ao discursar, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva frisou que “convivemos com um contingente de 733 milhões de pessoas ainda subnutridas. Em um mundo que produz quase 6 bilhões de toneladas de alimentos por ano, isso é inadmissível”. Divulgado pela ONU em junho de 2024, o relatório “O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo” informa que “cerca de 733 milhões de pessoas passaram fome em 2023, o equivalente a uma em cada 11 pessoas no mundo e uma em cada cinco na África”.
Ademais, oficialmente incorporada ao G20, a União Africana terá um de seus estados-membros presidindo o bloco em 2025: a África do Sul, país que assegurou a continuidade do G20 Social. Em suma, o G20 concentra 85% do PIB mundial, mais de 75% do comércio internacional e cerca de dois terços da população de 8 bilhões de pessoas.
BRICS
O Brasil assume em 2025, pela quarta vez, a gestão do BRICS, fórum de articulação entre os países emergentes, sob o lema “Fortalecendo a Cooperação do Sul Global por uma Governança mais Inclusiva e Sustentável”. Neste sentido, as metas consistem em estimular a cooperação econômica, política e social entre os membros e o aumento da influência dos países do Sul Global na governança internacional. Além disso, o Brasil pretende discutir a adoção de moedas locais no comércio entre os países do bloco e temas como mudanças climáticas, desenvolvimento sustentável com redução da pobreza e o gerenciamento da inteligência artificial.
Criado para ser um contraponto ao G7, liderado pelos Estados Unidos, o bloco de países emergentes, composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, detém mais de 42% da população mundial, 23% do PIB global, 18% do comércio internacional e 42% das reservas globais de petróleo e gás. Atualmente, o bloco possui 11 membros plenos, com a entrada da Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Irã e a Indonésia. Em 2025, a chancelaria brasileira anunciou a Nigéria, Belarus, Bolívia, Cazaquistão, Cuba, Malásia, Tailândia, Uganda e Uzbequistão como membros-parceiros.
COP30
A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30) consiste num encontro global e anual, reunindo representantes de mais de 190 países, como líderes mundiais, cientistas, organizações não-governamentais e representantes da sociedade civil. Presidido pelo Brasil em 2025, a cúpula ocorrerá em novembro, em Belém do Pará, na região amazônica.
No roteiro de debates constam redução de emissões de gases de efeito estufa, adaptação às mudanças climáticas, financiamento climático para países emergentes, tecnologias de energia renovável e soluções de baixo carbono, preservação de florestas e biodiversidade, justiça climática e os impactos socioeconômicos das mudanças climáticas, medidas consonantes a Convenção do Clima e o Acordo de Paris. O desafio é promover compromissos e investimentos para evitar os efeitos do aquecimento global e alterações climáticas.
Com isso, o G20 se comprometeu com iniciativas para limitar o aumento da temperatura a 1,5ºC, triplicar a capacidade global de energia renovável até 2030 e a transição para o fim do uso de combustíveis fósseis nos sistemas energéticos.
CONSIDERAÇÕES
Ao presidir o G20, BRICS e COP30, o Brasil sustenta a bandeira do multilateralismo, base de sua diplomacia. Uma de suas façanhas, no G20, consistiu em alinhavar a anuência de americanos e chineses, de países de economia desenvolvida e emergente, de representantes da União Europeia e União Africana às suas propostas, com destaque para a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. Nota-se também a prontidão da África do Sul, parceira do BRICS e a maior economia da União Africana, em manter o G20 Social durante a sua gestão no Grupo dos 20. Na prática, o Brasil frisa a mensagem de que apenas o sistema multilateral conduz os atores internacionais e os processos globais na busca pela paz, estabilidade social e desenvolvimento econômico sustentável.
No BRICS, a ambição é consolidar uma coalização entre os países do Sul Global, a fim de realçar a América Latina, África e Ásia como atores promissores no comércio internacional e na agenda social. Neste aspecto, uma das pautas é a desdolarização das transações comerciais entre os membros do bloco. O presidente estadunidense já se posicionou contrário a tal estratégia. Contudo, a inserção de mais países no BRICS pode, aos poucos, viabilizar uma rede plural frente ao Ocidente.
Na COP30, o Brasil pretende ampliar o apoio internacional para a implementação de políticas de preservação ambiental, desenvolvimento sustentável e combate à degradação dos ecossistemas. Neste sentido, o país tem a experiência angariada na Eco-92 e na Rio+20. Além disso, almeja demonstrar seus esforços nos setores de energias renováveis, biocombustíveis e agricultura de baixo carbono. Num contraponto às emergências climáticas, os Estados Unidos saíram do Acordo de Paris.
Líder na América Latina, o Brasil compreende que os desafios propostos evidenciam a importância das relações internacionais, a fim de implementar as propostas delineadas na conferência do G20 e os acordos vindouros no BRICS e COP30. Efetivamente, a diplomacia brasileira tem vastas tarefas, e recorre ao multilateralismo para pavimentar a cooperação internacional nas próximas décadas.
* Jambres Marcos de Souza Alves é jornalista formado pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas; pós-graduado em Geopolítica e Relações Internacionais pela Universidade Paulista de São Paulo e pelo Centro de Estudos em Geopolítica e Relações Internacionais. É membro da ASBRAGEO (Associação Brasileira de Geopolítica).
Comments are closed